O novo cessar-fogo no Leste da República Democrática do Congo (RDC), em vigor desde a meia-noite de domingo, visa promover um ambiente propício para o diálogo entre as partes envolvidas. Além disso, facilitará a assistência humanitária às populações deslocadas e garantirá o processo de acantonamento das forças beligerantes.
A constatação é do representante permanente de Angola junto da União Africana, o embaixador Miguel Domingos Bembe, para quem o acordo, conseguido pela mediação angolana, vai permitir, ainda, a retoma do Programa de Desarmamento, Desmobilização, Reintegração Comunitária e Estabilização (P-DDRCS) de iniciativa do Governo da RDC.
“A decisão das partes em conflito instituirem um cessar-fogo é crucial e incontornável para acelerar o processo de paz, estabilidade e segurança entre os dois países e na região, que passa pela erradicação, neutralização e desengajamento dos grupos armados que continuam a perpetrar actos de terrorismo e extremismo violento na Região Leste da RDC”, realçou o diplomata angolano.
Miguel Bembe ressaltou que, depois da primeira reunião ministerial entre a RDC e o Rwanda, realizada em Luanda, a 21 de Março deste ano, também sob a mediação angolana, a segunda reunião, de 30 de Julho, reafirmou a importância e interoperabilidade do Processo de Luanda para a restauração da paz, estabilidade e segurança entre aqueles dois países vizinhos. “Estas constituem condições indispensáveis para promover o desenvolvimento integral e sustentável na Região dos Grandes Lagos, com impacto na África Austral, em particular, e no continente africano, no geral”, destacou.
O representante permanente de Angola junto da União Africana (UA) referiu, por outro lado, que o último evento ministerial evidenciou a confiança crescente dos Presidentes Félix Tshisekedi e Paul Kagame em relação ao estadista angolano, na sua tripla qualidade de presidente em exercício da Conferência Internacional sobre a Região dos Grandes Lagos (CIRGL), mediador designado pelos Chefes de Estado e de Governo da UA e Campeão da UA para a Paz e Reconciliação em África. “Todos estes aspectos reforçam e consolidam a credibilidade do Processo de Luanda e do mediador angolano, encorajando-o a multiplicar as iniciativas, no quadro do cumprimento do mandato que lhe foi atribuído pela União Africana, em 28 de Maio de 2022”, aclarou o diplomata angolano na UA.
Mais uma vitória da diplomacia angolana
O professor angolano de Relações Internacionais Cesário Zalata considerou a conquista deste novo cessar-fogo na RDC mais uma vitória da diplomacia angolana e da dedicação pessoal do Chefe de Estado à causa. “O Presidente João Lourenço tem demonstrado, pelos seus esforços políticos e diplomáticos, ser verdadeiramente um actor congregador, pacificador, mediador, negociador e facilitador do diálogo”, destacou o académico.
Cesário Zalata acredita que este cessar-fogo constitui um bom sinal e abre uma “excelente” perspectiva para a construção dos caminhos para a paz na RDC, tendo em conta que será supervisionado e monitorido por um mecanismo Ad-Hoc reforçado. “Posso concluir que temos elementos substanciais para continuar a sonhar com a paz na República Democrática do Congo e que os erros e as falhas do primeiro cessar-fogo, de 2022, servirão de exemplos e lições para melhorar esta segunda fase do processo”, realçou Zalata.
Para o também especialista em Relações Internacionais Tiago Armando, a conquista deste cessar-fogo representa a capacidade de resiliência da mediação angolana face a todas as variáveis que colocavam em causa o processo e, ao mesmo tempo, crença num acordo de paz que visa garantir a estabilidade naquela região volátil dos Grandes Lagos.
Tiago Armando explicou que, no contexto diplomático, um cessar-fogo, durante um processo de mediação, se traduz num acordo temporário entre as partes em conflito para interromper as hostilidades. “Se olharmos a mediação como um processo construtivo, que se deve adaptar às dinâmicas do próprio conflito, para Angola e, em particular, ao Campeão da União Africana para a Paz e Reconciliação, isto representa a capacidade de resiliência face a todas as variáveis que colocam em causa a mediação e, ao mesmo tempo, crença num acordo de paz que vise garantir estabilidade na região”, frisou o especialista.
Relações RDC-Rwanda afectadas pelo conflito
A crise de paz e segurança no Leste da República Democrática do Congo afectou as relações entre aquele país e o vizinho Rwanda, que passaram a acusar-se mutuamente de apoiar a insurreição militar para desestabilizar um e outro, com Kinshasa a denunciar supostos apoios militares de Kigali ao grupo rebelde M23, acusação rejeitada pelo Rwanda, e este, por sua vez, a acusar Kinshasa de apoiar e abrigar no seu território as forças hutus responsáveis pelo genocídio de 1994, em que foram mortos mais de 800 mil tutsis e hutus moderados.
Com o objectivo de encontrar uma saída para o problema, a 16ª sessão extraordinária da Assembleia da União Africana sobre o Terrorismo e Mudanças Inconstitucionais de Governos em África, realizada no dia 28 de Maio de 2022, em Malabo, Guiné Equatorial, mandatou o Presidente João Lourenço, na qualidade de Presidente em exercício da Conferência Internacional sobre a Região dos Grandes Lagos (CIRGL) e Campeão para a Reconciliação e Paz em África, para mediar a crescente tensão que se regista na fronteira comum entre os dois países.
Entre as soluções conseguidas pela mediação angolana, para acabar com esta crise, está o “Roteiro de Luanda”, documento que aponta os caminhos para a pacificação do Leste da RDC. O documento foi aprovado, na capital angolana, no dia 6 de Julho de 2022, durante a Cimeira Tripartida da Conferência Internacional sobre a Região dos Grandes Lagos (CIRGL), entre Angola, RDC e Rwanda.
A Organização das Nações Unidas (ONU) considerou, em Maio do ano passado, o Roteiro de Luanda importante para a resolução da crise reinante no Leste da RDC, sublinhando tratar-se de um apoio valioso para o fim da crise naquela região.